Zé Ramalho abre sua própria gravadora e lança disco de inéditas



                                             Cantor não gravava músicas novas desde 2007


Agência O Globo

Publicação: 24/06/2012 13:11 Atualização: 24/06/2012 13:18
Mesmo no prédio do Leblon onde mora desde a década de 1980, Zé Ramalho carrega o sertão paraibano. A pequena Brejo do Cruz natal está, de forma clara, no sotaque e na base de suas referências poéticas e musicais. E, mais profundamente, nos valores que afirma em sua vida e carreira: a defesa dura de suas convicções; as relações baseadas na fidelidade extrema; a recusa do perdão aos desafetos. Sobre todos esses valores, a solidão do sertanejo que se basta com sua peixeira e gibão. Sua gravadora, Avôhai Music, que estreia com seu novo CD Sinais dos tempos (nas lojas no início de julho, o primeiro de inéditas desde 2007), é apenas a mais recente manifestação de seu caráter, que começou a se formar exatamente em pleno sertão paraibano "Meu pai morreu quando eu tinha 2 anos, afogado num açude, no meio do sertão", lembra. "Sem irmãos, descobri na solidão uma forma de me encontrar, encontrar meu lugar."



Mais do que se colocar no mundo pela solidão, Zé se orgulha dela, de ter afirmado em sua vida a sentença de Euclides da Cunha, "o sertanejo é, antes de tudo, um forte". Foi sozinho que Zé dormiu nas ruas do Rio enquanto buscava a oportunidade de gravar seu primeiro disco. E faz questão de dizer que não teve ajuda para largar o vício da cocaína, que chama de "fase negra" em "Indo com o tempo", que abre o novo CD.

"Foram três, quatro anos consumidos com drogas (na virada dos anos 1980 para os 1990, o que fez sua carreira entrar em suspensão). Deixei sozinho. Não fiz tratamento em clínica, nem psicanálise, nada", diz, antes de esclarecer que não se lamenta, usando a mesma frase que usa ao falar do pai. "As coisas são como são, e tudo foi importante para que eu fosse o que sou."

A ida para Campina Grande aos 3 anos, onde ouviu rádio pela primeira vez, e a chegada aos 11 em João Pessoa, onde conheceu o mar, lapidaram a sensibilidade do filho bruto do sertão, abrindo o caminho para a arte. Mais tarde, a audição de Bob Dylan se juntou aos gêneros nordestinos, a passagem por bandas de baile o apresentou a outros gêneros, vieram as leituras do neomisticismo de Carlos Castaneda e Erich von Däniken (Eram os deuses astronautas?) e da filosofia pessimista de Aldous Huxley (Admirável mundo novo inspirou Admirável gado novo) e as experiências com cogumelos (a "amanita matutina" da letra de Avôhai).

CDs e discos autoproduzidos
Mas nada foi capaz de amaciar a dureza com que Zé Ramalho defende suas convicções artísticas (sintetizada em frases como "nunca ninguém em gravadora mandou em mim" ou "não faço discos para jornalistas, nem mesmo para fãs"). É ele quem dirige seus shows e produz seus CDs (há 15 anos, divide a tarefa com Robertinho de Recife).

"Tenho uma dificuldade enorme de ser dirigido. No DVD Ao vivo (de 2005), João Falcão ia ser o diretor", conta. "Na primeira reunião, falou: 'Zé, vou te botar vestido de Dom Quixote.' Eu disse: 'Isso não vai rolar.' E não rolou. Eu mesmo dirigi."

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